O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) admitiu hoje que o número de pessoas que vai fugir de Nagorno-Karabakh para a Arménia chegue aos 120 mil, ou seja, toda a população arménia que vivia no enclave.
“As Nações Unidas já estão a analisar planos de médio e longo prazo para apoiar o Governo arménio na integração destas pessoas”, acrescentou numa teleconferência a partir de Erevan, capital arménia, transmitida para a imprensa credenciada junto à ONU em Genebra.
Cerca de 63 mil refugiados já foram registados pelo Governo da Arménia, onde “o processo de acolhimento está a ser bastante bem gerido”, tendo em conta as enormes multidões que chegam a cidades fronteiriças com o Azerbaijão, referiu a representante da ONU.
O Governo separatista do Nagorno-Karabakh anunciou na quinta-feira que se vai dissolver e que a república não reconhecida vai deixar de existir até ao dia 1 de janeiro de 2024.
O anúncio foi feito depois de o Azerbaijão ter levado a cabo uma ofensiva militar para recuperar o controlo total da região separatista e ter exigido que as tropas arménias em Nagorno-Karabakh depusessem as armas e o governo separatista se desmantelasse.
Quase metade da população da região de Nagorno-Karabakh, no Cáucaso, já fugiu para a Arménia, mas muitos mais são esperados.
Muitas pessoas chegam esgotadas, “depois de uma longa viagem, que normalmente duraria duas ou três horas, mas que, para muitos, chega a demorar oito”, devido às longas filas na fronteira, adiantou Kavita Belani.
O representante da Federação Internacional da Cruz Vermelha (FICV) no país caucasiano, Hicham Diab, acrescentou que as crianças “chegam tão fracas que algumas desmaiam à chegada, nos braços dos pais ou do pessoal da Cruz Vermelha arménia”.
“É como se tivessem chegado à linha de chegada de uma maratona. Pessoalmente nunca vi nada parecido”, reconheceu.
Belani lembrou que muitos dos refugiados não só sofreram com a longa viagem, mas também com o bloqueio imposto pelo Azerbaijão a Nagorno-Karabakh durante nove meses, impedindo a entrada no enclave de muitos alimentos, medicamentos e outros bens básicos.
“Muitos estão ansiosos, aterrorizados e querem respostas sobre o que vai acontecer a seguir, como por exemplo, se vão ter uma residência temporária na Arménia ou se vão ficar aqui por muito tempo”, disse a representante do ACNUR.
Kavita Belani reconheceu que a integração desta população será complicada em muitas áreas, como por exemplo no domínio da educação, já que muitas escolas locais — atualmente a serem usadas como centros de acolhimento de migrantes – não têm espaço suficiente para uma chegada massiva de crianças.
Por outro lado, o Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV), única organização que pôde atuar, durante os meses de bloqueio, na região de Nagorno-Karabakh, destacou que nos últimos dias tratou 130 pessoas que necessitavam de cuidados médicos, sobretudo depois da explosão de um tanque de combustível em Stepanakert, capital do enclave.
A organização participou também no tratamento de 200 cadáveres, vítimas do confronto armado que culminou com a entrega de Nagorno-Karabakh ao exército do Azerbaijão e da explosão, que, segundo os serviços de emergência locais, causou pelo menos 170 mortos.
Já no início deste mês, o Conselho Europeu tinha alertado para a “rápida deterioração” da situação humanitária na região, tendo apelado ao Azerbaijão e à Arménia para salvaguardar a população e diminuir as tensões.
As duas ex-repúblicas soviéticas do Cáucaso enfrentaram-se em duas guerras, no início dos anos 1990 e em 2020, pelo controlo do enclave de Nagorno-Karabakh, uma região montanhosa cuja população é maioritariamente arménia e que se separou do Azerbaijão há mais de 30 anos.
No final da curta guerra em que, no outono de 2020, o Azerbaijão recuperou territórios dessa região separatista, Baku e Erevan concluíram um cessar-fogo promovido pela Rússia.
As tensões intensificaram-se este ano, quando Baku anunciou, em 23 de abril, ter instalado um primeiro posto de controlo rodoviário à entrada do corredor de Latchin, único eixo que liga a Arménia ao enclave separatista, já submetido a um embargo que causou escassez de bens de primeira necessidade e cortes de energia elétrica.